domingo, 1 de agosto de 2010

Reflexos


Fragmentos de uma realidade difusa...

A Prece




"A lua nova chegou, foi e voltou de novo. Nessas noites não conseguia dormir. Em vez disso sentava-me à janela onde ardia a vela e pensava na pequena criança que me estendera a mão na escuridão, no pesadelo. Não me deixes. Na minha mente pegava naquela criança, que também era um homem e rodeava-a com os braços, apertando-a contra o meu coração, até que as primeiras luzes da alvorada tocavam o céu. E se bem que nunca falasse em voz alta, falava com ele constantemente através das sombras que o rodeavam. Estou aqui. Não tenhas medo. Eu abraço-te. Eu não te deixo. Por fim, chegava a madrugada. O Sol nascia e começava um novo dia. Dizia-lho; e quando havia luz suficiente para ele ver por onde ia, apagava a vela, tocava na pena de corvo gentilmente com a ponta dos dedos e saía, bocejando, para começar um novo dia de trabalho."

O Filho das Sombras, Juliet Marillier.

Guincho


Guincho.

Platanus



Ecos de uma antiguidade que se repete a cada dia...

A Vela




"No dia seguinte ao meu regresso a casa fiz uma vela. Nada de extraordinário; tal trabalho fazia parte do dia-a-dia de uma casa. Mas era suposto eu descansar. A minha mãe inspeccionou o meu quarto, mandou varrer o chão, esticou-me a colcha e foi ter comigo à ervanária, onde eu estava a trabalhar, com o cabelo lavado de fresco e apertado atrás com uma fita. Se viu os meus lábios inchados e pisados, se reconheceu marcas de mordidelas no meu pescoço, não fez qualquer comentário. Em vez disso, observou as minhas mãos enquanto desenhavam num dos lados da cera, metodicamente, um intrincado desenho de curvas, espirais e tracejados. O outro lado ficou liso. Eu não disse nada. Quando acabei, para minha satisfação, coloquei-a num robusto suporte, em volta da base atei a tira de pele com unhas de lobo e uma pequena grinalda que entrançara. Por fim, a minha mãe falou.

Esse sortilégio é muito poderoso. Cornizo, milefólio e zimbro. Maçã e alfazema. E isso são penas das asas de um corvo? Onde vai esta vela arder, filha?

Na minha janela."

O Filho das Sombras, Juliet Marillier.